Pesquisar este blog

domingo, 27 de março de 2011

CONCURSO PÚBLICO: A INCOMPATIBILIDADE ENTRE APROVADOS – TEMPORÁRIOS - CADASTRO DE RESERVA



Na qualidade de professor de Direito Administrativo e advogado na área pública acompanho há anos a luta daqueles que conquistam uma vaga em concurso público, mas não são nomeados.
Inacreditavelmente, a idéia de se fazer um concurso é porque há carência de pessoal para  um cargo público, seja na administração pública direta ou indireta - federal, estadual ou municipal. Os concursandos, ainda hoje, possuem o ideal de que se há o lançamento de um edital é para preenchimento imediato das vagas prometidas. Não é bem assim.
Infelizmente, a Administração Pública comete pecados capitais contra aqueles que pagam a inscrição, fazem as provas do concurso, são aprovados e classificados.
Julgo, que o maior pecado é estipular no edital a aberração denominada CADASTRO DE RESERVA. Tal prática, nada mais é do que burlar os princípios constitucionais que devem revestir a Administração Pública na prática de todos os seus atos, especialmente, nos concursos públicos.
Por que digo que é uma burla? Porque a Administração Pública entende que ao estipular nos editais cadastro de reserva não haverá obrigatoriedade para nomear os aprovados e classificados dentro do prazo de validade do concurso.
Entendo eu, que o cadastro de reserva, nada mais nada menos deveria ser aquele formado, naturalmente, pelos aprovados, mas não classificados para o número de vagas prometidas. Assim, num concurso que se promete 40 (quarenta) vagas, a Administração Pública, dentro do prazo de validade do concurso, deverá, obrigatoriamente, nomear os 40 (quarenta) primeiros classificados. Os demais que alcançaram a pontuação suficiente para aprovação, mas estão fora das 40 (quarenta) vagas, irão fazer parte de um cadastro de reserva durante a validade do concurso.
Contudo, não é esta a hermenêutica da Administração Pública, e, que é corroborada por mito julgados. Numa interpretação forçada criaram um concurso, especialmente, para cadastro de reserva. Com toda a seriedade que o caso requer: isso é um absurdo!
Fazer um concurso, especificamente, para cadastro de reserva é burlar os princípios constitucionais, especialmente, da moralidade, razoabilidade, e, da dignidade da pessoa humana. Isso tudo, porque é criar uma falsa realidade! É brincar com a dignidade humana num momento em que ter um emprego é a garantia de alimentos na mesa, de moradia digna para a família, de estudos para os filhos. Não se pode jogar com um assunto tão sério! Tudo virou mera expectativa de direito!
No nosso singelo pensar, concurso público para preenchimento de vagas é concurso público para o preenchimento de vagas! Ponto final! Não há que se inventar! A expectativa diz respeito tão somente ao chamamento para a ocupação das vagas durante o período de validade do concurso. Mas tem que chamar os aprovados para a ocupação das vagas prometidas!
A relação Administração Pública e Servidores Públicos tem na expectativa de direito um subterfúgio. A Administração Pública possui poder discricionário para nomear quantos servidores quiser e quando quiser, dizem e julgam alguns. Fundamentam, ainda, essa questão no Interesse Público!
Não posso concordar! Nosso posicionamento é no sem tido de que a promessa de vagas tem fundamento num processo administrativo que finalizou pela necessidade dos cargos divulgados. Não se pode a qualquer hora, ou, por mera discricionariedade extinguir os cargos. Se o Interesse Público tiver que ser invocado, que seja para proteger aqueles que foram aprovados no concurso e devem ser nomeados.
Caso a Administração Pública resolva agir fora desses parâmetros, ela fere de morte a Constituição da República. Por vezes ela contrata por prazo determinado alguém para a vaga do aprovado, e, chama esta contratação de TEMPORÁRIA.
Para exemplificar esta aberração, cito um caso cuja concursanda impetrou Mandado de Segurança no TJMT porque havia passado num concurso público na UNEMAT, para o cargo de professora universitária. Quando chegou a vez dela ser nomeada a universidade contratou no seu lugar um professor em caráter temporário.
Ela tentou administrativamente resolver o problema. Nada. Impetrou o  competente Mandado de Segurança, alegando que a contratação temporária somente tem lugar em casos de substituição por conta de afastamento do titular para estudos, por exemplo, mas, jamais para ocupar cargo em vacância absoluta.
Inacreditavelmente, o Pleno do TJMT votou unanimemente, dando razão à UNEMAT, e, esta fez prevalecer um temporário sobre um concursado.
Porém, sem perder a esperança do que a Constituição da República prescreve, a candidata interpôs Recurso Ordinário no STJ, onde alcançou a reforma do acórdão do Pleno estadual. Assim rezou a decisão monocrática do Ministro FELIX FISCHER:
“Decido.
Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. A jurisprudência desta c. Corte Superior já sedimentou seu entendimento no sentido de que, embora aprovado em concurso público, tem o candidato mera expectativa de direito à nomeação.
Porém, essa expectativa de direito se convola em direito subjetivo para os candidatos quando, dentro do prazo de validade do concurso, existe contratação precária de terceiros, concursados ou não, para exercício dos mesmos cargos.
É inconteste nos autos que a recorrente logrou aprovação em quinto lugar no concurso para o cargo que disputou (fls. 81/82 do processo eletrônico).
Também é incontroverso que, durante o prazo de validade do concurso, que seria de 2 anos com possibilidade de prorrogação por igual período (item 15.5 do edital de abertura - fl. 38 do processo eletrônico), a Administração efetuou contratação emergencial de professores temporários.
Ressalte-se inclusive que a ora recorrente participou do processo seletivode contratação de professor temporário realizado no ano de 2009, resultando em sua seleção para preenchimento do cargo vago decorrente da exoneração do então professor fulano de tal (substituído por nós), aprovado em segundo lugar no concurso para preenchimento de cargo efetivo regido pelo Edital n.º 02/2006-SAD/MT, no qual a impetrante alçou a quinta colocação.
Caracterizada está a preterição da impetrante, já que comprovada a vacância no cargo de Professor da Educação Superior, na área de Ensino da História no Campus Universitário de Cáceres, e sua aprovação no concurso para preenchimento de cargo efetivo, cuja validade fora prorrogada por mais dois anos a partir de 28 de junho de 2008 (fl. 85 do processo eletrônico).
Dentro desse contexto, exsurge o direito líquido e certo da recorrente de exigir da Administração a sua nomeação, pois inequivocamente demonstrada a necessidade de servidores para a área, tanto é que a própria recorrente foi contratada temporariamente para exercer as mesmas funções do cargo efetivo, em substituição a outro aprovado no certame.
Com esse entendimento, confiram-se os precedentes:
"RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE PROFESSOR DE ENSINO FUNDAMENTAL. CONTRATAÇÃO, EM CARÁTER PRECÁRIO E DENTRO DO PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME, PARA EXERCER AS MESMAS FUNÇÕES DAQUELE CARGO. NECESSIDADE DE PREENCHIMENTO DA VAGA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO.
1. O candidato aprovado em concurso público para o cargo de professor estadual e contratado, dentro do prazo de validade do certame, a título precário para exercer as mesmas funções daquele cargo, tem direito subjetivo à nomeação, ante a necessidade de preenchimento da vaga pela Administração. Precedentes.
2. Recurso provido. "
(RMS 16.195/MS, 6ª Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 23/3/2009).
"RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE PROFESSOR. CONTRATAÇÕES, A TÍTULO PRECÁRIO, DURANTE A VALIDADE DO CERTAME. CONVOLAÇÃO DA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO E POSSE EM DIREITO LÍQUIDO E CERTO.
1. Em tema de concurso público, é cediço que os concursandos não possuem direito subjetivo à nomeação, mas apenas expectativa. Contudo, essa expectativa se convola em direito subjetivo se houver preterição na ordem classificatória ou contratação a título precário pela Administração para o preenchimento de vagas existentes, em detrimento da nomeação de candidatos aprovados em certame ainda válido. Precedentes.
2. Na hipótese, as Recorrentes, aprovadas em concurso público em 8º e 9º lugares, e que figuravam como próximas da lista classificatória a serem nomeadas, foram contratadas para exercer os cargos em caráter precário, tendo sido demonstrado nos autos, ainda, a concessão de aposentadorias a 2 (duas) professoras, tudo dentro do prazo de validade do certame.
3. Recurso conhecido e provido. "
(RMS 24.542/MS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 17/11/2008).
"DIREITO ADMINISTRATIVO - CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DO CARGO DE ESCRIVÃO. VAGA SURGIDA PELA REMOÇÃO DO PRIMEIRO COLOCADO. COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO PROVISÓRIO DAS FUNÇÕES PELA CANDIDATA SUBSEQÜENTE. NECESSIDADE DA ADMINISTRAÇÃO DEMONSTRADA. APROVEITAMENTO. DIREITO À NOMEAÇÃO -PRECEDENTES - RECURSO PROVIDO.
1. Esta Corte tem se manifestado no sentido de que, '[...] constatando-se a contratação para preenchimento de vagas em caráter precário, ainda no prazo de validade do concurso, bem como a necessidade perene de preenchimento de vaga e a existência de candidato aprovado em concurso válido, a expectativa se convola em direito líquido e certo'. (RMS 15.602/PR, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 07.12.2004)
2. No caso referente aos autos, a impetrante foi designada para exercer as funções do cargo aspirado, do que se infere, portanto, que o exercício provisório das funções atinentes ao cargo vago, pela própria impetrante, antes que exaurido o prazo de validade do concurso, confirmou a nítida necessidade da Administração em ocupá-lo.
3. Recurso provido. "
(RMS 16.489/PR, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 10/11/2008).
"ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATOS APROVADOS. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. ILEGALIDADE.
I - É entendimento doutrinário e jurisprudencial de que a aprovação em concurso público gera mera expectativa de direito à nomeação, competindo à Administração, dentro de seu poder discricionário, nomear os candidatos aprovados de acordo com a sua conveniência e oportunidade.
II - Entretanto, a mera expectativa se convola em direito Superior Tribunal de Justiça líquido e certo a partir do momento em que, dentro do prazo de validade do concurso, há contratação de pessoal, de forma precária, para o preenchimento de vagas existentes, em flagrante preterição àqueles que, aprovados em concurso ainda válido, estariam aptos a ocupar o mesmo cargo ou função.
III - Comprovada pela recorrente a classificação no concurso para professor de língua portuguesa, em primeiro lugar, em ambos os cargos que disputou, bem como incontroverso que houve a contratação, em caráter precário, de profissionais para suprir a carência de pessoal nasce, assim, o direito líquido e certo de exigir da autoridade competente à nomeação, pois demonstrada, inequivocamente, a necessidade de servidores para essa área.
Recurso provido, para determinar a nomeação e posse da recorrente. "
(RMS 24.151/RS, 5ª Turma, de minha relatoria, DJ de 8/10/2007).
Ante o exposto, dou provimento ao recurso ordinário para determinar à Administração que nomeie e dê posse à recorrente no cargo efetivo de Professor da Educação Superior, na área de Ensino da História no Campus Universitário de Cáceres.
P. e I.
Brasília (DF), 02 de agosto de 2010.
MINISTRO FELIX FISCHER
Relator
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 30.770 - MT (2009/0210737-5)”

Assim, entendo que nem a Administração Pública nem o Judiciário deve ignorar o grito por JUSTIÇA dos concursandos que, aprovados e devidamente classificados, esperam, juntamente com seus familiares, a tão sonhada nomeação para um cargo público que lhe dará estabilidade, e, é de direito.

JOSÉ LUÍS BLASZAK
Advogado e Professor de Direito Administrativo
blaszak@hotmail.com