O direito eleitoral é peculiar. A
legislação trata de direito material e processual de forma mesclada, invocando o
Código de Processo Civil como subsidiário. A prática processual, por sua vez, possui
seus percalços.
O código eleitoral, Lei nº 4.737, é datado
de 15 de julho de 1965. Não precisa aqui delinear o seu surgimento, sua
maioridade, sua fase adulta e sua já terceira idade para dizer de suas nuances.
Defendo que misturou-se e mistura-se o direito material e processual no mesmo
ordenamento por interesses – o político se destaca . E, diga-se de passagem, o
processo em si deixa muito a desejar.
Ao longo do tempo não houve coragem
suficiente para uma verdadeira reforma eleitoral. O que se teve até o presente
momento é uma verdadeira colcha de retalhos com a consagração de minirreformas.
Temos a Lei Complementar nº 64 de 18 de
maio de 1990 (Lei das Inelegibilidades) (em 04 de junho de 2010 teve o advento
a Lei Complementar nº 135, que alterou a LC 64/90), a Lei nº 9.096 de 15 de setembro de 1995 (Lei
dos Partidos), a Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997 (Lei Eleitoral), a Lei
nº 13.165 de 29 de setembro de 2015, as inúmeras Resoluções do TSE. Isso tudo,
faz acomodar o advento do novo código eleitoral brasileiro.
Esta mera visita aos tantos normativos
eleitorais já indica em parte o porquê de certos percalços jurídicos no
desenrolar dos processos judiciais eleitorais. Os diferentes prazos para
contestar e suas respectivas formas de contagens nas representações e ações
judiciais eleitorais destacam-se dentre os percalços. Daremos aqui especial
atenção a eles.
Eneida Desiree Salgado em co-autoria com Thiago
Pries Valiati e Paula Bernardelli aborda em obra recente o caráter
assistemático das regras processuais eleitorais[1]:
“Deve-se reconhecer que não é simples a
tarefa de aplicar o direito eleitoral. Suas normas, espalhadas por diplomas
diversos, elaborados em contextos políticos muito distintos, são repletas de
conceitos jurídicos indeterminados, e não é fácil compatibilizar seus comandos.
Para alcançar uma consistência na adjudicação do direito eleitoral, seria
importante uma consolidação das regras eleitorais, com uma análise prévia da
compatibilidade da legislação coma Constituição, além do afastamento cabal do
(inconstitucionalmente autoconcedido) poder normativo do Tribunal Superior
Eleitoral.
O âmbito processual é refém dessa
situação. As ações eleitorais estão espalhadas por diversos diplomas, como a
Lei das Eleições (representações, reclamações e direitos de resposta), a Lei
das Inelegibilidades (ação de impugnação de registro de candidato, ação de investigação judicial eleitoral), o
Código Eleitoral (recurso contra expedição de diploma, ações penais) e na
Constituição (ação de impugnação de mandato eletivo).”
No mundo processual eleitoral, quanto aos
prazos, há um duplo momento, ou seja, durante
o período eleitoral, em que o TSE fixa as datas por meio da Resolução que
trata do Calendário Eleitoral, e fora do
período eleitoral. Naquele, os prazos “são
peremptórios e contínuos e correm em secretaria ou Cartório e, a partir da data
do encerramento do prazo para registro de candidatos, não se suspendem aos
sábados, domingos e feriados”[2]
e neste “serão computados na forma do
art. 224 do Novo Código de Processo Civil”[3].
Acrescente-se, que durante o período
eleitoral (há fixação de datas como marco inicial e final) as
citações/notificações (a legislação eleitoral utiliza ora o vocábulo notificação e ora citação) podem ser feitas por oficial de justiça, bem como por meio
de correio eletrônico e/ou por fac-símile, ambos indicados pelos candidatos,
coligações e partidos. Conta-se o prazo, então, a partir da mera ciência.
Fora do período eleitoral as
citações/notificações devem ser feitas obrigatoriamente por oficial de justiça.
Repudia-se as ligações telefônicas promovidas pelos cartórios das zonas
eleitorais “convidando” as partes para serem citadas/notificadas. Tal prática
irregular se deve ao fato de que na justiça eleitoral não há pagamento de
diligências.
O promotor de justiça e autor eleitoralista
Rodrigo Lopez Zílio aborda o tema na sua consagrada
obra Direito Eleitoral [4] quando escreve sobre a AIME.
E traz o seu posicionamento, do TRE/RS e do TSE, verbis:
“A legislação eleitoral é carente na regulamentação das
ações eleitorais. Embora previsão de diversas ações eleitorais (v.g., AIRC,
AIJE, e representação pelos artigos 30-A, 41-A, 73 a 77 da LE), apenas a LC nº
64/90 traz a previsão de dois procedimentos específicos (arts. 3º a 14 e artigo
22) – além do rito sumaríssimo previsto no art. 96 da LE para as representações
por descumprimentos à Lei das Eleições.
Como se trata de ação ajuizada após a diplomação (quando não
existe mais a fluência contínua e ininterrupta dos prazos processuais e
tampouco o plantão permanente da Justiça Eleitoral), as regras de citação e intimação
das partes devem observar, ao máximo, seja assegurada a plenitude do
contraditório e da ampla defesa. Desta forma, a notificação, intimação ou
citação das partes, em regra, deve ser realizada pessoalmente ou por publicação
no Diário de Justiça Eleitoral.
A contagem do prazo,
porque se trata de ação de cunho eleitoral (embora de natureza cível), deve
prestigiar a celeridade dos feitos processuais, sendo adequado admitir o início
da contagem a partir da mera ciência do ato processual (como, aliás, é até mesmo na esfera penal, conforme Súmula
710 do STF)[5].
O TRE-RS, no entanto, já admitiu a contagem do prazo a partir da juntada,
quando a citação for efetuada por oficial de justiça, assentando que “a omissão
na LC n, 64/90 quanto à forma de contagem do prazo para a contestação conduz à
aplicação subsidiária da legislação processual civil na apuração da
tempestividade” (Recurso Eleitoral nº 311272 – Rel. Dra Ana Beatriz Iser – j.
05.10.2010). No mesmo sentido, o TSE defendeu a aplicação da regra do Código de
Processo Civil que estabelece a juntada do mandado de notificação como marco
inicial para a contagem do prazo para a apresentação de defesa na AIME (Recurso
Ordinário nº 6931-36 – Rel. Min. Gilson Dipp – j. 08.05.2012).” (grifo nosso).
É de suma importância frisar que para as
matérias da Lei Eleitoral – a Lei nº 9.504/97, em especialmente tocante à propaganda
eleitoral, aplica-se o rito processual do art.
96 da Lei nº 9.504/97, que fixa o
prazo para a defesa em 48 (quarenta e oito) horas, verbis:
“Art. 96. Salvo disposições específicas em contrário desta
Lei, as reclamações ou representações relativas ao seu descumprimento podem ser
feitas por qualquer partido político, coligação ou candidato, e devem
dirigir-se:
I - aos Juízes Eleitorais, nas eleições municipais;
II - aos Tribunais Regionais Eleitorais, nas eleições
federais, estaduais e distritais;
III - ao Tribunal Superior Eleitoral, na eleição
presidencial.
§ 1º As reclamações e representações devem relatar fatos,
indicando provas, indícios e circunstâncias.
(...)
§ 5º Recebida a
reclamação ou representação, a Justiça Eleitoral notificará imediatamente o
reclamado ou representado para, querendo, apresentar defesa em quarenta e
oito horas.
(...)
Art. 96-A. Durante o período eleitoral, as intimações via
fac-símile encaminhadas pela Justiça Eleitoral a candidato deverão ser
exclusivamente realizadas na linha telefônica por ele previamente cadastrada,
por ocasião do preenchimento do requerimento de registro de candidatura. (Incluído
pela Lei nº 12.034, de 2009)
Parágrafo único. O prazo
de cumprimento da determinação prevista no caput é de quarenta e oito horas, a
contar do recebimento do fac-símile. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)”
Chama-se a atenção para
o prazo de contestação que é de 48 (quarenta e oito) horas.
Nesta linha, o TSE, para as Eleições
Municipais de 2016, publicou a Resolução nº 23.462, de 15 de dezembro de
2015, que dispôs sobre representações,
reclamações e pedidos de resposta previstos na Lei nº 9.504/1997, onde o prazo para defesa é de 48 (quarenta e
oito) horas.
“Resolução nº 23.462/2015
Art. 5º Os prazos relativos às reclamações, às
representações e aos pedidos de resposta são contínuos e peremptórios e não se
suspendem aos sábados, domingos e feriados entre 15 de agosto e 16 de dezembro
de 2016 (Lei Complementar nº
64/1990, art. 16), excepcionados os
feitos de competência do Tribunal Superior Eleitoral, que observarão o disposto
no Calendário Eleitoral.
§ 1º Nesse período, o arquivamento de procuração dos advogados
representantes dos candidatos, dos partidos e das coligações, assim como das
emissoras de rádio e televisão, dos provedores e servidores de Internet, dos
demais veículos de comunicação e de empresas e entidades realizadoras de
pesquisas eleitorais no Cartório Eleitoral torna dispensável, exclusivamente para as representações e
reclamações de que trata esta resolução, a juntada do instrumento de
procuração, devendo a circunstância ser registrada na petição em que se valerem
dessa faculdade, o que será certificado nos autos.
(…)
CAPÍTULO
II
DO
PROCESSAMENTO DAS RECLAMAÇÕES, DAS REPRESENTAÇÕES E DOS PEDIDOS DE
RESPOSTA
Seção I
Disposições Gerais
Art. 6º As representações, subscritas por advogado ou por
representante do Ministério Público, deverão ser apresentadas com as
respectivas contrafés, em quantas vias forem as partes demandadas – salvo se
protocoladas por fac-símile ou petição eletrônica –, e relatarão fatos,
indicando provas, indícios e circunstâncias (Lei nº 9.504/1997,
art. 96, § 1º).
(...)
Art. 8º Recebida a petição inicial, o Cartório Eleitoral
providenciará a imediata citação do(s)
representado(s), com a contrafé da petição inicial e, quando houver, a
degravação da mídia de áudio e/ou vídeo, para, querendo, apresentar(em) defesa no prazo de quarenta e oito horas (Lei nº 9.504/1997,
art. 96, § 5º), exceto quando se
tratar de pedido de direito de resposta, cujo prazo será de vinte e quatro
horas (Lei nº 9.504/1997,
art. 58, § 2º).
No caso das representações que visarem à
apuração das hipóteses previstas nos arts. 23, 30-A, 41-A, 45, inciso VI, 73, 74, 75 e 77 da Lei nº 9.504/1997
observarão o rito estabelecido pelo art. 22 da Lei
Complementar nº 64/1990, que fixa o prazo para a defesa em 5 (cinco) dias. A Resolução passou
a assim dispor para as Eleições Municipais de 2016:
“Resolução nº 23.462/2015
Seção III
Das Representações Específicas
(…)
Art. 23. Nas eleições de 2016, o Juiz Eleitoral será
competente para conhecer e processar a representação prevista na Lei Complementar nº
64/1990, exercendo todas as
funções atribuídas ao Corregedor-Geral ou Regional, cabendo ao representante do
Ministério Público Eleitoral em função na Zona Eleitoral as atribuições
deferidas ao Procurador-Geral e ao Procurador Regional Eleitoral, nos termos
dos incisos I a XV do
art. 22 e das demais normas de
procedimento previstas na Lei Complementar nº 64/1990.
Art. 24. Ao despachar a inicial, o Juiz Eleitoral adotará as
seguintes providências:
a) ordenará que seja citado o representado, encaminhando-lhe
a segunda via da petição, acompanhada das cópias dos documentos, para que, no prazo de cinco dias, ofereça defesa
(Lei Complementar nº
64/1990, art. 22, inciso I, alínea a);
Art. 25. Feita a
notificação, o Cartório Eleitoral juntará aos autos cópia autêntica do ofício
endereçado ao representado, bem como a prova da entrega ou da sua recusa em
aceitá-la ou em dar recibo (Lei Complementar nº
64/1990, art. 22, inciso IV).
É de suma importância atentar que a Lei
Complementar nº 64/1990 dispõe de dois
ritos processuais, quais sejam, o do
art. 3º a 16 (para AIRC e AIME) e
o do art. 22 (para as demais hipóteses
previstas nos arts. 23, 30-A, 41-A, 45, VI, 73, 74, 75 e 77 da Lei nº 9.504/97,
devendo para estes ser observado o rito processual estabelecido pelo art. 22 da
Lei Complementar nº 64/90, incisos I a XIII.), verbis:
“Art. 3° Caberá a qualquer candidato, a partido político,
coligação ou ao Ministério Público, no prazo de 5 (cinco) dias, contados da
publicação do pedido de registro do candidato, impugná-lo em petição
fundamentada.
§ 1° A impugnação, por parte do candidato, partido político
ou coligação, não impede a ação do Ministério Público no mesmo sentido.
§ 2° Não poderá impugnar o registro de candidato o
representante do Ministério Público que, nos 4 (quatro) anos anteriores, tenha
disputado cargo eletivo, integrado diretório de partido ou exercido atividade
político-partidária.
§ 3° O impugnante especificará, desde logo, os meios de
prova com que pretende demonstrar a veracidade do alegado, arrolando
testemunhas, se for o caso, no máximo de 6 (seis).
Art. 4° A partir da data em que terminar o prazo para
impugnação, passará a correr, após devida notificação, o prazo de 7 (sete) dias para que o candidato, partido político ou
coligação possa contestá-la, juntar documentos, indicar rol de
testemunhas e requerer a produção de outras provas, inclusive documentais, que
se encontrarem em poder de terceiros, de repartições públicas ou em
procedimentos judiciais, ou administrativos, salvo os processos em tramitação
em segredo de justiça.
(...)
Art. 16. Os prazos a que se referem o art. 3º e seguintes
desta lei complementar são peremptórios e contínuos e correm em secretaria ou
Cartório e, a partir da data do encerramento do prazo para registro de
candidatos, não se suspendem aos sábados, domingos e feriados.
(...)
Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou
Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral,
diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando
provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do
poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos
ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido
político, obedecido o seguinte rito:
I - o Corregedor, que terá as mesmas atribuições do Relator
em processos judiciais, ao despachar a inicial, adotará as seguintes
providências:
a) ordenará que se
notifique o representado do conteúdo da petição, entregando-se-lhe a
segunda via apresentada pelo representante com as cópias dos documentos, a fim
de que, no prazo de 5 (cinco) dias,
ofereça ampla defesa, juntada de documentos e rol de testemunhas, se
cabível;
(…)
IV - feita a
notificação, a Secretaria do Tribunal juntará
aos autos cópia autêntica do ofício endereçado ao representado, bem como a
prova da entrega ou da sua recusa em aceitá-la ou dar recibo;”
Assim, para a Ação de Impugnação de Registro de Candidatura – AIRC o rito a ser
seguido deve ser o insculpido no art. 3º da LC nº 64/90, que fixa o prazo para a contestação em 7 (sete) dias.
A Ação de Impugnação de Mandato Eletivo
– AIME, por sua vez, adota o mesmo rito citado, por força do jurisprudência
consolidada, segundo José Jairo Gomes[6]:
“Assentou-se na jurisprudência que o procedimento a ser
observado é aquele previsto nos artigos 3º a 16 da LC nº 64/90 para a Ação de
Impugnação de Registro de Candidatura (AIRC), considerado “ordinário” na seara
eleitoral. Por óbvio o diploma processual civil será sempre invocável subsidiariamente.
É este – reitere-se – o entendimento vitorioso e iterativo na hodierna
jurisprudência eleitoral:
“[...] Na Ação de
Impugnação de Mandato Eletivo, até a sentença, o rito a ser observado é o
previsto na LC nº 64/90” (TSE – Respe Ac. Nº 25.443/SC, de 14-2-2006 – DJ
10-3-2006, p.177).
“A Ação de Impugnação de Mandato Eletivo observará o
procedimento previsto na Lei Complementar nº 64/90 para registro de
candidaturas, com aplicação subsidiária, conforme o caso, das disposições do
Código de Processo Civil, e tramitará em segredo de justiça, respondendo o
autor na forma da lei, se temerária ou manifesta má-fé (Constituição Federal,
art. 14, §11)”(TSE – Res. nº 23.372/2011, art. 170, §1º; Res. nº 23.399/2013,
art. 228, §1º)”
Para as eleições municipais de 2016, a
Resolução do TSE nº 23..456/2015, no seu art. 173, §1º, repetiu a regra das resoluções
anteriores, na linha jurisprudencial consagrada de fixação do rito da AIME, verbis:
“Art. 173. O mandato eletivo poderá também ser impugnado
na Justiça Eleitoral após a diplomação, no prazo de quinze dias, instruída
a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude
(Constituição Federal, art. 14, § 10).
§ 1o A ação de impugnação de mandato eletivo observará
o procedimento previsto na Lei Complementar no 64/1990 para o registro de
candidaturas, com a aplicação subsidiária, conforme o caso, das
disposições do Código de Processo Civil, e tramitará em segredo de
justiça, respondendo o autor na forma da lei, se temerária ou de manifesta
má-fé (Constituição Federal, art. 14, § 11).”
Como se vê a legislação eleitoral apresenta
certas nuances nem sempre compreendidas. A justificativa unânime é de que o
breve tempo entre os registros de candidaturas e a data das eleições exige este
escalonamento de prazos – paras as demandas de propaganda eleitoral um prazo
deveras exíguo e ampliado em alguns dias para as demais representações e ações
judiciais eleitorais.
Se não bastasse a falta de uniformidade
para a fixação dos prazo da contestação,
a contagem também traz seus percalços.
Alguns eleitoralistas, tendo em vista a
idéia da celeridade no âmbito eleitoral, interpretam que o prazo para contestar flui a partir da ciência da citação/notificação
da representação/ação judicial.
Para que não houvesse dúvida, o legislador
deveria ter sido explícito. Não foi na lei nem nas resoluções. Em que pese a nossa
resistência e de muitos eleitoralistas no exercício de legislar por meio de
resoluções, poderia o TSE ter aproveitado a Resolução nº 23.478/2016 para dar
um norte neste assunto. Não fez.
É público e notório o advento do novo
código de processo civil. Após ampla e controvertida discussão no meio
eleitoralista, a Corte Superior Eleitoral editou, em 10 de maio de 2016, a
Resolução nº 23.478/2016, que estabeleceu diretrizes gerais para a aplicação da
Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 – o Código de Processo Civil em vigor –,
no âmbito da Justiça Eleitoral.
Sob o argumento da necessária celeridade, o
TSE, por meio de Resolução, brecou a contagem dos prazos em dias úteis no
âmbito processual eleitoral. Com todas as venias,
a contagem em dias úteis não é o que atrasaria os julgamentos no âmbito da
justiça eleitoral, mas sim o tempo que os processos param nos cartórios, nos
gabinetes e nos trâmites recursais. O advento dos prazos em dias úteis foi para
poupar o trabalho dos advogados nos finais de semanas e feriados. E todos os
advogados agradecem!
Com certeza, não seria a contagem dos
prazos em dias úteis que impediria a justiça eleitoral de dar a resposta devida
à sociedade. O não cumprimento dos prazos pelos advogados sempre foi é será uma
espécie de “morte fatal”! Tem que cumprir imediatamente!
O texto da Resolução do TSE nº 23.478/2016
fixou regra própria para a contagem dos prazos, verbis:
“Art. 2º Em razão da especialidade da matéria, as ações, os
procedimentos e os recursos eleitorais permanecem regidos pelas normas específicas
previstas na legislação eleitoral e nas instruções do Tribunal Superior
Eleitoral.
Parágrafo único. A aplicação das regras do Novo Código de
Processo Civil tem caráter supletivo e subsidiário em relação aos feitos que
tramitam na Justiça Eleitoral, desde que haja compatibilidade sistêmica.
Art. 3º Aplicam-se aos processos eleitorais o contido nos
arts. 9º e 10 do Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015).
(…)
CAPÍTULO II
DOS PRAZOS
Art. 7º O disposto no
art. 219 do Novo Código de Processo Civil não se aplica aos feitos eleitorais.
§ 1º Os prazos processuais, durante o período definido no
calendário eleitoral, serão computados na forma do art. 16 da Lei Complementar
nº 64, de 1990, não se suspendendo nos fins de semana ou feriados.
§ 2º Os prazos
processuais, fora do período definido no calendário eleitoral, serão computados
na forma do art. 224 do Novo Código de Processo Civil.
§ 3º Sempre que a lei eleitoral não fixar prazo especial, o
recurso deverá ser interposto no prazo de 3 (três) dias, a teor do art. 258 do
Código Eleitoral, não se aplicando os prazos previstos no Novo Código de
Processo Civil.”
Diz
o art. 219, do NCPC, vetado pelo TSE, verbis:
“Art. 219. Na contagem de prazo em dias, estabelecido
por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se
somente aos prazos processuais.”
A par disso, o TSE perdeu a oportunidade de
acrescentar na Resolução regra para a
contagem do prazo para contestar as representações e ações eleitorais. A
prática da contagem dos prazos é confusa no âmbito dos Tribunais Regionais
Eleitorais e suas respectivas zonas.
É importante de lembrar o art. 250 do
Código de Processo Civil em vigor, o qual determina os procedimentos para citação/notificação
por mandado sob responsabilidade de oficial de justiça. Frise-se, são raros os
mandados de citação/notificação que são completos no sentido do citado artigo.
Lembremos o que o art. 250 do Código de
Processo Civil estipula para o mandado:
“Art. 250. O mandado que o oficial de justiça tiver de
cumprir conterá:
I - os nomes do autor e do citando e seus respectivos
domicílios ou residências;
II - a finalidade da citação, com todas as especificações
constantes da petição inicial, bem como a
menção do prazo para contestar, sob pena de revelia, ou para embargar a
execução;
III - a aplicação de sanção para o caso de descumprimento da
ordem, se houver;
IV - se for o caso, a intimação do citando para comparecer,
acompanhado de advogado ou de defensor público, à audiência de conciliação ou
de mediação, com a menção do dia, da hora e do lugar do comparecimento;
V - a cópia da petição inicial, do despacho ou da decisão
que deferir tutela provisória;
VI - a assinatura do escrivão ou do chefe de secretaria e a
declaração de que o subscreve por ordem do juiz.”
Acrescenta-se
à pendenga a dúvida sobre o início da contagem do prazo para contestar.
Conta-se da data da ciência da citação/notificação ou da juntada do mandado (do
último quando há mais de um citado/notificado) devidamente cumprido pelo
oficial de justiça?
Na prática, muitos advogados adotam a contagem dos prazos para contestar
a partir da ciência da citação/notificação e não da juntada do mandado
devidamente cumprido (ou do último mandado quando há mais de um
citado/notificado) com medo de perder prazo. Isso significa, suprimir um plus de
tempo precioso na elaboração da peça de defesa.
Conclusão
Os tribunais já
se posicionaram de que o prazo para contestar as representações/ações judicias
fora do período eleitoral é o da juntada do mandado de citação/notificação
devidamente cumprido pelo oficial de justiça. É necessário divulgar amplamente
para que todas as instâncias judiciais eleitorais apliquem uniformemente tal
contagem de prazo e façam constar explicitamente dos mandados de
citação/notificação todos os elementos do art. 250 do Código de Processo Civil.
· José Luís Blaszak é professor e advogado eleitoralista. Foi Juiz Membro do TRE/MT
Biênio 2012/2014.
· Email: jlblaszak@gmail.com
[1] SALGADO, Eneida Desiree;
VALIATI, Thiago Priess; BERNARDELLI, Paula. O livre convencimento do juiz
eleitoral versus a fundamentação
analítica xigida pelo novo Código de Processo Civil. In TAVARES, André Ramos; AGRA, Walber de Moura; PEREIRA, Luiz
Fernando (Coord.). O direito eleitoral e o novo Código de Processo Civil. Belo
Horizonte: Forum, 2016. P. 338
[2] Art. 16 da LC nº 64/90
[3] Art. 224 do NCPC
- Salvo disposição em contrário, os prazos serão
contados excluindo o dia do começo e incluindo o dia do vencimento.
§ 1º Os dias do começo e do vencimento do prazo serão
protraídos para o primeiro dia útil seguinte, se coincidirem com dia em que o
expediente forense for encerrado antes ou iniciado depois da hora normal ou
houver indisponibilidade da comunicação eletrônica.
§ 2º Considera-se como data de publicação o primeiro dia
útil seguinte ao da disponibilização da informação no Diário da Justiça
eletrônico.
§ 3º A contagem do prazo
terá início no primeiro dia útil que seguir ao da publicação.
[5] Súmula 710 - STF: “No processo penal, contam-se os prazos da data da intimação, e não da
juntada aos autos do mandado ou da carta precatória ou de ordem.”
[6] GOMES, José Jairo.
Direito eleitoral. 12.ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 791